Eleições gerais em risco: Governo de bolsos vazios e partidos desesperados

O governo moçambicano está a enfrentar uma crise de liquidez sem precedentes. Neste momento, a receita pública não consegue atender às necessidades da sociedade, mas o governo precisa prestar serviços e realizar obras e eventos inadiáveis, como as eleições gerais, o que exige gastos significativos.

Agosto 7, 2024 - 17:06
Agosto 7, 2024 - 17:34
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Eleições gerais em risco: Governo de bolsos vazios e partidos desesperados

Este assunto está a ser gerido com muita cautela pelo executivo, que não quer assumir a crise, quando faltam apenas 15 dias para o arranque da campanha eleitoral e até hoje não há um centavo sequer transferido aos partidos políticos inscritos para participar no processo, factor que compromete a qualidade do processo.

A TORRE.News sabe, através de fontes oficiais, que o Governo gasta 2,1 bilhões de dólares norte-americanos com o serviço da dívida pública (interna e externa), resultado do somatório das amortizações e pagamentos de juros que atingiram um pico histórico.

A factura da dívida e a implementação da Tabela Salarial Única são os grandes absorvedores das receitas, agravando ainda mais o cenário apertado de tesouraria, causado pela discrepância entre a receita e a despesa.

Enquanto as amortizações e juros sufocam a tesouraria, o executivo continua a recorrer ao endividamento interno, com juros mais altos, para financiar a despesa, sobretudo de salários e remunerações, e está igualmente a gerir várias greves no sector público, com relatos de atrasos salariais.

“O valor colocado ao serviço da dívida representa um agravamento de 70% comparativamente à despesa do ano de 2022”, lê-se no Boletim Trimestral sobre Dívida Pública, instrumento do Ministério de Economia e Finanças que retrata a evolução da dívida do Governo central no primeiro trimestre de 2024, destacando o comportamento do stock do serviço da dívida e dos desembolsos, que continua em ascensão meteórica.

Impacto na qualidade do processo eleitoral

Recentemente, a Comissão Nacional de Eleições (CNE) “denunciou” que ainda não havia recebido do tesouro o orçamento de 260 milhões de meticais, verba destinada aos partidos políticos para a compra de material de propaganda eleitoral, no quadro da corrida eleitoral agendada para Outubro próximo.

Esta situação é reveladora dos desafios enfrentados pela tesouraria do governo e do impacto que isso pode acarretar na qualidade do escrutínio de 9 de Outubro.

“Neste momento, ainda não foi desembolsado nada para a campanha eleitoral”, disse o porta-voz da CNE, Paulo Cunica, empurrando a responsabilidade para o Ministério de Economia e Finanças, dirigido pelo ministro Max Tonela, que recentemente evitou perguntas sobre o pagamento da dívida de horas extraordinárias que o Governo tem com os professores desde 2021.

A situação está a criar incerteza entre as formações políticas nacionais, especialmente na oposição, tanto com assento no parlamento como os extra-parlamentares, que dependem exclusivamente deste orçamento para a sua movimentação política e logística de caça ao voto.

Reacções dos partidos políticos

A Renamo, principal partido da oposição, é um dos casos que sente na pele o aperto. O seu líder saiu tardiamente para a pré-campanha, alegadamente por falta de fundos, tendo em conta que as poucas economias do partido foram gastas na realização do Congresso da Renamo, que elegeu Ossufo Momade para candidato presidencial.

“Por causa da situação financeira do partido, não era para realizar nenhum congresso. O presidente gastou os poucos recursos que tínhamos com essa reunião, por isso estamos limitados em pré-campanha”, disse uma fonte bem colocada na Renamo à TORRE.News.

O Movimento Democrático de Moçambique (MDM), a terceira força política, diz que a demora vai complicar a preparação do partido, uma vez que a importação de material é um processo que leva tempo e, para já, não vê possibilidade de ter o material disponível até à data prevista para o arranque da campanha eleitoral.

“O que vai acontecer é que nós vamos ter que iniciar a campanha sem o material de propaganda eleitoral”, disse Ismael Nhacucue, porta-voz do partido, em contacto com a TORRE.News.

Nhacucue avançou que, segundo a promessa da CNE, os partidos esperam que o valor seja desembolsado até o final do mês em curso.

Já o partido PODEMOS considera a demora na canalização dos fundos por parte da CNE como uma acção de má-fé, além de ser uma clara violação da lei. O presidente do partido, Albino Forquilha, refere que a demora visa essencialmente impossibilitar a preparação dos partidos, o que, para si, constitui uma afronta aos pressupostos de democracia.

“Em princípio, isto não é só má-fé, mas também um incumprimento da lei, porque é de lei que os partidos políticos sejam concedidos esses fundos para o bem da democracia. Portanto, esse fundo deve ser desembolsado com antecedência para permitir que os partidos políticos se organizem”, disse Forquilha.

Por sua vez, a Nova Democracia (ND) diz que o atraso no desembolso dos fundos significa uma sabotagem feita pela CNE para beneficiar o partido Frelimo.

“O que nos preocupa é que esse é mais um momento de irregularidades e de sabotagem política para garantir que os outros actores não concorram em pé de igualdade com aqueles que estão no poder desde a independência”, considerou Armando Mahumana, porta-voz do ND.