Cabo Delgado: Empresários de Palma encostam TotalEnergies à parede
Empresários de Palma confrontaram a TotalEnergies sobre exclusão nas oportunidades do projecto Mozambique LNG, avaliado em 20 mil milhões de dólares, exigindo benefícios reais para a economia local. Em resposta, a petrolífera prometeu maior abertura e diálogo, mas os empresários alertam que a paciência está a esgotar-se num distrito onde a pobreza contrasta com a riqueza gerada pelo gás natural.

Enquanto se ensaia o regresso do projecto Mozambique LNG, paralisado há quatro anos devido à deterioração da segurança, a crise de confiança entre o sector empresarial de Palma e a TotalEnergies dominou a reunião realizada no Sábado no distrito de Palma, província de Cabo Delgado, onde se localiza o megaprojecto de gás natural avaliado em 20 mil milhões de dólares.
Durante o encontro, empresários locais denunciaram a sua exclusão das oportunidades geradas pelo projecto, exigindo mais transparência, inclusão e redistribuição dos benefícios económicos. O director-geral da TotalEnergies em Moçambique, Maxime Rabilloud, procurou acalmar os ânimos, prometendo maior diálogo com os operadores económicos da região, pedindo paciência e garantindo que Palma será tratada como um parceiro directo.
As intervenções dos empresários foram marcadas por frustração e desconfiança. Acusaram a petrolífera francesa de isolar o acampamento de Afungi da economia local e de negligenciar os compromissos com os empreendedores de Palma. Hospedagens, restaurantes, serviços de logística e fornecimento de produtos alimentares têm enfrentado dificuldades devido à concentração das operações dentro do acampamento, sem ligações efectivas com os negócios locais.
“Sabemos que tem um número significativo de trabalhadores em Afungi, mas não deixam que se instalem na vila. Isso mata a economia local. Temos hotéis e restaurantes sem clientes porque tudo está concentrado no acampamento”, afirmou Momed Omar, empresário do sector de hotelaria.
Do sector de logística, Ema Salimo foi contundente nas críticas: “Dizem que compram produtos aos empresários locais, mas não é bem assim. Há esquemas em que pessoas dentro do projecto fornecem os produtos e dizem que vieram de nós. Aqui está tudo parado, é preciso agir com urgência”, denunciou, referindo-se a alegados favorecimentos e corrupção interna.
Confrontado com estas acusações, Maxime Rabilloud reconheceu falhas de comunicação e prometeu mudanças. “Foi uma reunião importante. Notei que existem falhas que criaram mal-entendidos. Não há nenhuma intenção de reduzir as compras aos empresários locais. Pelo contrário, com o levantamento da Força Maior, as compras vão intensificar”, disse, sublinhando que grande parte da alimentação destinada aos cerca de dois mil trabalhadores já é adquirida localmente.
O director-geral assegurou que irá envolver-se pessoalmente na resposta às preocupações apresentadas. “Vou engajar-me pessoalmente para garantir que o sector empresarial de Palma beneficie directamente do projecto”, afirmou.
O encontro, que não produziu consensos, foi adiado para o dia 11 de Setembro, data em que a TotalEnergies enviará uma equipa técnica para sistematizar as inquietações locais. Rabilloud comprometeu-se a regressar a Palma ainda este mês para acompanhar os progressos. “Depois da equipa, eu próprio virei cá para sentar convosco. O nosso compromisso é claro: desenvolver Moçambique, Cabo Delgado e Palma em particular”, prometeu.
Para Pedro Silva, representante da Associação das Actividades Económicas de Palma, o gesto da TotalEnergies é positivo, mas exige resultados concretos. “Esperamos que desta vez cumpram a promessa de dialogar e incluir as nossas empresas. Há muita inquietação sobre a exclusão das oportunidades do projecto. O dia 11 será determinante”, afirmou.
Com o anúncio iminente da retoma oficial do projecto Mozambique LNG, os empresários exigem que os benefícios do maior empreendimento de gás natural liquefeito de África não fiquem limitados a investidores estrangeiros e multinacionais, mas cheguem efectivamente à população local.
Apesar de albergar um dos maiores projectos energéticos do continente africano, Palma continua mergulhada na pobreza. Muitas comunidades não têm acesso à energia, à água potável nem a saneamento adequado. As estradas internas estão degradadas, dificultando o escoamento de produtos agrícolas, enquanto o desemprego juvenil continua elevado.
Grande parte da população sobrevive da pesca artesanal e da agricultura de subsistência, com rendimentos extremamente baixos. Pequenos empresários que investiram em infraestruturas para fornecer bens e serviços ao projecto sentem-se excluídos, sem retorno dos seus investimentos.
O distrito carece de hospitais com capacidade de resposta, de escolas em condições mínimas e de perspectivas de emprego para os jovens, que frequentemente abandonam os estudos por falta de infraestruturas e de oportunidades.
Este contraste brutal entre a presença de uma das maiores multinacionais do mundo e a precariedade vivida pelas comunidades alimenta tensões e descontentamento. Organizações da sociedade civil e líderes comunitários apontam para a distância entre os discursos de desenvolvimento e os impactos reais. Palma é hoje um território rico em recursos, mas pobre em condições de vida, e isso torna-se cada vez mais insustentável.