FastJet à espera de descolar: indecisão do Governo pode estar ligada à recente entrada de CFM, EMOSE e HCB no capital da LAM

Com quatro aeronaves Embraer 145 parqueadas no Aeroporto Internacional de Maputo, contratos firmados com empresas de handling, catering e fornecimento de combustível, e mais de 120 trabalhadores posicionados nos destinos domésticos, a companhia Solenta Aviation Moçambique, em parceria com a FastJet, continua impedida de operar por falta de uma licença que aguarda desde Abril. Em entrevista exclusiva à TORRE.News, o Director-Geral da empresa, Brian Holmes, revelou que o primeiro voo estava previsto para o dia 16 de Junho e que a demora na emissão da licença pelo Instituto de Aviação Civil de Moçambique (IACM) está a causar prejuízos superiores a 300 mil dólares norte-americanos por mês. 

Junho 30, 2025 - 15:30
Junho 30, 2025 - 15:38
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FastJet à espera de descolar: indecisão do Governo pode estar ligada à recente entrada de CFM, EMOSE e HCB no capital da LAM

A situação está a levantar suspeitas de bloqueio deliberado à entrada de novos operadores no mercado nacional, alegadamente para proteger investimento de 130 milhões de USD para salvar as Linhas Aéreas de Moçambique (LAM), companhia de bandeira, através de uma decisão do Conselho de Ministros (CM), que aprovou a alienação de 91% das acções do Estado na empresa LAM as empresas Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB), Caminhos-de-Ferro de Moçambique (CFM) e Empresa Moçambicana de Seguros (EMOSE), todas pertencentes ao sector empresarial do Estado. A reestruturação LAM, que culminaria com mudanças na direcção máxima da empresa, aquisição de novas aeronaves, foi feita pelo executivo durante o balanço dos 100 dias de governação, quando o processo do novo operador já estava bem encaminhado no IACM.

Segundo Holmes, toda a documentação exigida foi submetida, a taxa de licença já foi paga e os requisitos legais foram integralmente cumpridos, sem que o regulador tenha apresentado qualquer impedimento ao processo. Contudo, nem o IACM nem o Ministério dos Transportes e Comunicações se pronunciaram sobre a autorização, apesar das várias reuniões realizadas com os responsáveis do sector. Neste momento, a empresa aguarda por uma audiência com o Ministro João Matlombe.

“Neste momento só estamos à espera dessa licença, que até já pagámos em Abril. Já cumprimos com tudo para sermos certificados. Já cumprimos todos os aspectos e não há nenhum impedimento que o regulador tenha levantado. Não temos nenhuma resposta do ministério, nem do regulador, nem do ministério”, disse o Director-Geral da empresa, realçando que a demora na emissão da licença está a provocar prejuízos financeiros avultados, uma vez que já foram estabelecidos contratos com fornecedores de serviços essenciais à operação.

A Solenta Aviation Moçambique já celebrou contratos com empresas responsáveis por serviços de handling, check-in, catering e abastecimento de combustível. Conta com 18 pilotos contratados, entre nacionais e estrangeiros, e mais de 120 colaboradores já posicionados em todos os destinos domésticos. As quatro aeronaves estão prontas e estacionadas à espera de autorização para voar. O lançamento oficial da companhia estava marcado para o dia 10 de Junho.

Holmes sublinha que o projecto, actualmente suspenso pelas autoridades, representa um investimento acima de 15 milhões de dólares, incluindo leasing das aeronaves e investimentos directos, com o objectivo de dinamizar o sector do transporte aéreo no país e apoiar as operações da companhia de bandeira, as Linhas Aéreas de Moçambique (LAM), actualmente mergulhada em dificuldades operacionais. “Nós achamos que há mercado para todos. Não somos concorrentes da LAM, somos auxiliares. Queremos colocar serviços de qualidade e dar confiança aos passageiros”, vincou.

O director acrescenta que o próprio regulador encorajou o projecto nas suas fases iniciais, reconhecendo a necessidade de novos operadores no mercado nacional. “Queremos que nos digam se podemos ou não operar. Já temos tudo preparado. Se não é para operar, que expliquem o porquê”, desabafou o director da empresa. 

Refira-se que, em entrevista concedida à TORRE.News em Maio deste ano, o Presidente do Conselho de Administração do IACM, Comandante João de Abreu, considerou que a entrada do novo operador seria uma mais-valia para os passageiros, que, até então, estiveram reféns de um único prestador de serviços: a LAM, cujo historial recente tem sido marcado por má gestão, voos cancelados, deficiências operacionais e reclamações recorrentes dos consumidores. “O passageiro ganha quando há concorrência. Terá finalmente a oportunidade de escolha e, com isso, poderá também beneficiar de melhores tarifas e melhor qualidade de serviço. A ausência de concorrência conduz à estagnação, à acomodação e a um serviço que não responde às expectativas do utente”, disse De Abreu.

Na mesma entrevista, o PCA do IACM mencionou que outras companhias estrangeiras manifestaram interesse em retomar ou iniciar operações para Moçambique, entre elas a Air France, Emirates, Air Link (em substituição da South African Airways), além das já operacionais TAAG, TAP, Qatar Airways, Turkish Airlines e Kenya Airways, esta última recentemente regressada ao país.

Num contexto de liberalização formal do espaço aéreo moçambicano, consagrado pela Lei de Aviação Civil, a actual postura do Executivo, através do IACM, representa uma contradição com o quadro legal vigente. A falta de explicações concretas levanta suspeitas de eventuais manobras para inviabilizar a entrada de novos operadores, perpetuando um monopólio ineficiente que penaliza os passageiros e impede o crescimento do sector. A crise no transporte aéreo nacional, marcada por constantes cancelamentos de voos, atrasos e deficiências de serviço por parte da LAM, exige soluções urgentes e transparentes. A entrada de novos operadores pode ser parte essencial dessa resposta, mas continua bloqueada nos corredores do poder.