O Discurso, senhores candidatos!
Os discursos dos candidatos à presidência frequentemente carecem de rigor científico. Para serem eficazes, devem equilibrar Ethos (credibilidade), Pathos (emoções) e Logos (razão), ajustando-se ao público-alvo, especialmente aos jovens. A preparação cuidadosa e o uso estratégico da retórica são cruciais para persuadir e conectar-se autenticamente com os eleitores, transformando palavras em poderosas ferramentas de mobilização.
Vivemos tempos atípicos em termos de comunicação, o que me recorda lições valiosas da minha formação. Na Grécia Antiga, durante o período de ócio, houve um florescimento significativo no desenvolvimento do conhecimento nas ciências sociais. Os gregos, livres de preocupações imediatas, reuniam-se nas praças públicas para discursar e debater. Este ambiente de liberdade intelectual, conforme descrito pela teoria das necessidades de Maslow, colocava-os no topo da pirâmide, onde as necessidades básicas estavam satisfeitas, permitindo-lhes focar-se no crescimento intelectual e na autorealização.
Certamente, essa não é a nossa realidade. Em Moçambique, enfrentamos inúmeras necessidades por satisfazer. Contudo, curiosamente, possuímos também uma grande vontade de nos expressar. Todos têm algo a dizer ou a contradizer. Diariamente, ao ligar a televisão, ouvir a rádio, ler um jornal ou nas redes sociais, deparamo-nos com retóricos, argumentadores e/ou comentadores activos, que frequentemente se apresentam como especialistas em diversas áreas do saber. Considero isto um sinal positivo. Assim como na Grécia Antiga, acredito que usaremos os nossos argumentos e debates para impulsionar o desenvolvimento da nossa pátria amada. A comunicação, mesmo em tempos de adversidade, pode ser uma poderosa ferramenta para a mudança e o progresso.
Deixemos esta temática para outra oportunidade. Agora, gostaria de partilhar uma modesta observação sobre os discursos que tenho acompanhado dos candidatos à presidência da República de Moçambique para as próximas eleições de 9 de Outubro.
Antes de avançar, e em benefício de todos, vou apresentar algumas definições clássicas de discurso. Aristóteles, na sua obra "Retórica", define discurso como a arte de persuadir usando ethos (credibilidade), pathos (emoções) e logos (razão). Michel Foucault, em "A Ordem do Discurso", vê o discurso como um sistema de pensamento ligado ao poder e ao conhecimento, que constrói e mantém estruturas sociais. Jürgen Habermas, na sua teoria da acção comunicativa, define discurso como comunicação racional orientada para o entendimento mútuo, essencial para alcançar consensos na esfera pública. Estas definições são fundamentais para analisar e construir comunicações políticas eficazes.
Confesso que não conheço em detalhe os métodos utilizados na concepção dos discursos dos principais candidatos à presidência nas suas pré-campanhas. No entanto, como entusiasta e especialista em comunicação estratégica e marketing político, tenho observado que há uma evidente carência de rigor científico na sua elaboração. Talvez esses discursos sejam fruto de um improviso ou do instinto natural dos candidatos, ou, quem sabe, tenham sido elaborados por um distinto doutor, fechado no conforto do seu gabinete climatizado, alheio à realidade do eleitorado e isolado do contacto directo com as questões que verdadeiramente importam.
Os eleitores que outrora votavam cegamente nos partidos envelheceram e, actualmente, são poucos os que sairão dos seus aposentos para exercer o direito de voto. As estatísticas são claras: Moçambique é um país jovem, com uma idade média de 17 anos. Estes jovens não possuem compromisso com nenhuma instituição ou partido. Eles necessitam ser persuadidos por meio de argumentos que os convençam, tanto emocional como logicamente, de que os seus problemas serão resolvidos. Apenas desta forma confiarão o seu voto a uma pessoa, e não a uma marca de um partido repleta de interesses conflituosos. A política está a encaminhar-se para o fim dos partidos políticos (este tema será desenvolvido em outra oportunidade).
Por esta razão, os candidatos devem prestar muita atenção aos seus discursos. Felizmente, existe uma ciência dedicada a este estudo: as teorias do discurso e da argumentação. Entre estas, destacam-se a teoria da argumentação de Perelman e Olbrechts-Tyteca, e a teoria da argumentação Pragma-dialéctica de Van Eemeren e Grootendorst.
A minha preferida, no entanto, é a de Aristóteles, exposta na sua obra "A Retórica", uma das mais antigas e influentes. Aristóteles não complicou a nossa vida, apresentando uma estrutura de discurso e argumentação simples e aplicável em qualquer circunstância, especialmente na política.
Na "Retórica", Aristóteles define três modos de persuasão:
Logos: Apelo à lógica e à razão, essencial para construir argumentos sólidos e convincentes. Através do Logos, o orador busca persuadir o público apresentando provas, dados e raciocínios lógicos que suportam a sua tese. Exemplo: "De acordo com o Instituto Nacional de Estatística, a idade média dos moçambicanos é de 17 anos."
Pathos: Apelo às emoções, fundamental para construir um discurso que motiva e inspira o público. Através do Pathos, o orador procura evocar emoções específicas nos ouvintes, influenciando as suas atitudes e comportamentos. Utilizar narrativas pessoais ou casos concretos que ressoem emocionalmente com o público é essencial para estabelecer uma ligação profunda e significativa. Exemplo: "Recordo-me de um jovem que encontrei numa aldeia, cujo sonho é ter acesso a uma educação de qualidade para mudar a sua vida e a da sua família."
Ethos: Apelo à credibilidade e ao carácter do orador, essencial para estabelecer confiança e autoridade perante o público. Através do Ethos, o orador demonstra que é digno de confiança, competente e ético. A construção desta credibilidade pode ser alcançada através da demonstração de experiência, conhecimento e integridade. Exemplo: "Como alguém que dedicou toda a sua carreira à causa pública, comprometo-me a servir com integridade e transparência."
Estes três modos de persuasão devem ser integrados em todos os discursos de forma equilibrada. A predominância de um ou outro deve ser ajustada conforme o público-alvo. Por exemplo, num discurso dirigido a um público mais instruído academicamente, o candidato deve dar maior peso ao Logos (lógica) e ao Ethos (credibilidade). No entanto, isso não significa que deve negligenciar o Pathos (emoção), mas sim utilizá-lo de uma forma subtil e que atenda às expectativas da audiência. Para isso, é fundamental realizar uma pesquisa prévia da audiência, conduzida por uma equipa de avanço in loco e através das plataformas digitais, utilizando a análise das palavras-chave mais pesquisadas naquela região para compreender melhor os interesses e preocupações do público.
Aristóteles, em sua obra clássica "Retórica", sugere uma estrutura detalhada do discurso, dividida em introdução, narrativa, argumentos, refutação e conclusão. No entanto, para não tornar este artigo excessivamente longo e tedioso, prefiro parar por aqui com a promessa de voltar a aprofundar este tópico em futuros artigos, oferecendo sugestões práticas e exemplos específicos que podem ser aplicados directamente pelos candidatos.
Portanto, ilustres patriotas candidatos à presidência da nossa pátria amada, apelo-vos que utilizem a ciência e a arte da retórica na elaboração dos vossos discursos. Uma abordagem bem estruturada e estrategicamente pensada garantirá resultados mais eficazes e uma conexão mais forte com o vosso eleitorado. Recordem-se que um discurso não é apenas um conjunto de palavras, mas uma poderosa ferramenta de persuasão e mobilização.