Hospitais públicos podem ficar sem medicamentos nos próximos dias: Estado deve mais de 6 mil milhões e fornecedores ponderam cortar fornecimento de medicamentos
Moçambique enfrenta o risco iminente de ruptura no fornecimento de medicamentos e materiais hospitalares, com empresas e associações do sector privado a ponderarem suspender a prestação de serviços ao Estado. O motivo é a dívida acumulada de mais de 6 mil milhões de Meticais que o Governo deve a fornecedores da área da saúde, que alegam não ter mais capacidade financeira para continuar a sustentar o sistema, sob pena de colapso das suas operações.

A informação foi avançada à TORRE.News por Alexandre Fernandes, CEO da SwissLab e Vice-presidente para a área da Saúde na Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA). Segundo o empresário, as empresas que operam na importação e distribuição de medicamentos, reagentes laboratoriais e outros insumos hospitalares estão à beira da falência, pressionadas por dívidas acumuladas há anos e pela ausência de respostas concretas por parte do Governo.
“Temos organizações e associações com facturas em atraso. Já se ponderou várias vezes cortar o fornecimento, mas há sempre a componente social. É que, se param, os pacientes morrem”, alertou Fernandes, sublinhando que os contratos com o Estado exigem fornecimento antecipado com pagamento diferido, muitas vezes com atrasos superiores a dois anos.
Segundo os fornecedores, a gestão dos contratos por parte do Estado agrava ainda mais a situação. Denunciam que continuam a ser lançados concursos públicos sem que estejam mobilizados os fundos para a sua execução, em clara violação da Lei de Contratação Pública, que exige a garantia prévia da verba antes da adjudicação. “Os contratos até preveem adiantamentos mediante garantias bancárias, mas quando chega o momento da execução, o Estado alega não ter fundos disponíveis”, afirmou a mesma fonte.
A crise chega num momento em que vários hospitais públicos do país já enfrentam ruptura de stock de medicamentos essenciais, colocando em risco a vida de milhares de doentes, incluindo grávidas, crianças e pessoas com doenças crónicas. Em diversas províncias, os relatos de falta de fármacos e materiais básicos têm-se multiplicado, agravando ainda mais a fragilidade do sistema nacional de saúde.
O sector privado, que historicamente tem sustentado grande parte da cadeia de fornecimento ao Estado, alerta que já não possui margem de manobra para continuar a financiar o serviço público de saúde, tendo em conta os encargos bancários e a falta de garantias de pagamento. “Por causa do risco, neste momento escolhemos a dedo os contratos. O negócio com o Estado passou a ser uma ameaça à sobrevivência das empresas”, lamentou Fernandes.
Caso o Governo não regularize urgentemente a dívida, o país poderá assistir nos próximos dias a um cenário crítico de colapso no abastecimento de medicamentos aos hospitais públicos. O alerta fica lançado num contexto em que a saúde pública continua a ser um dos sectores mais sensíveis e frágeis, onde qualquer interrupção pode custar vidas humanas.