Rejeição da CAD: Vogal da CNE e membro do MDM sob investigação disciplinar

O Movimento Democrático de Moçambique (MDM) está insatisfeito com Bernabé Ncomo, vogal do partido na Comissão Nacional de Eleições (CNE), devido ao seu apoio à rejeição da candidatura da Coligação Aliança Democrática (CAD) para as eleições Legislativas e Assembleias Provinciais de Outubro próximo.

Julho 25, 2024 - 15:36
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Rejeição da CAD: Vogal da CNE e membro do MDM sob investigação disciplinar

A direcção do MDM, através da sua comissão jurisdicional, convocou Ncomo para uma audição no próximo sábado, onde deverá justificar as motivações e convicções que fundamentaram o seu comportamento, ciente do posicionamento do partido em relação à CAD. Ncomo arrisca enfrentar um processo disciplinar.

A informação foi avançada à TORRE.News pelo quadro sénior do MDM, Augusto Pelembe, que caracterizou a deliberação da CNE como um acto de intolerância política que o partido não apoia nem partilha. 

“O MDM convocou o vogal para se explicar. A reunião terá lugar no sábado. Tratou-se de intolerância política. Não faz sentido que a CNE aceite tudo e mais tarde venha dizer que o que deliberou já não é válido. A nulidade é uma manobra dilatória e isso é mau para a democracia”, disse Pelembe em entrevista à TORRE.News.

De acordo com a mesma fonte, o MDM condena a atitude da CNE, não apoia a deliberação e espera que o Conselho Constitucional, na qualidade de tribunal especialista em matéria eleitoral, reponha a verdade e devolva a CAD à corrida eleitoral, considerando o princípio do pluralismo em processos desta natureza.  

Contudo, Pelembe entende que o vogal indicado pela terceira força política em Moçambique possa ter apoiado a rejeição da CAD de forma independente.

O posicionamento de Ncomo foi denunciado por Salomão Moiane, também vogal da CNE, que expôs as razões políticas que levaram o consórcio Frelimo e Renamo a rejeitarem “ilegalmente” a candidatura da CAD, quando a sua inscrição havia sido aprovada e publicada em Boletim da República pelo mesmo órgão, encerrando a fase no quadro do princípio de aquisição progressiva dos actos eleitorais. 

“Foi estranho que colegas do órgão, vindos dos partidos políticos, Frelimo, Renamo e MDM tivessem consenso sobre a matéria, prejudicando o princípio de pluralismo político por via de exclusão da CAD”, disse Moiane.

Ao comportar-se desta forma, o MDM permitiu que uma coligação política concorrente fosse administrada um veneno mortífero, igual ao que foi dado ao próprio MDM em 2009, quando o Movimento Democrático de Moçambique viu chumbadas ilegalmente as suas listas em 6 dos 10 círculos eleitorais por razões meramente políticas. 

Nesse ano, a Frelimo e Renamo, conduzidos pela lógica de bipolarização, excluíram o MDM em 9 dos 13 círculos eleitorais.

A decisão foi criticada pelos próprios partidos, sociedade civil e também pelos representantes dos doadores internacionais, como os embaixadores da União Europeia.

A CNE alegou na altura que a candidatura do MDM continha irregularidades, como a falta de documentos. Por outro lado, a CNE não notificou os partidos para entregarem os documentos em falta ou para substituírem os candidatos em questão, como está previsto na lei eleitoral e por via disso, a nova terceira força do país viu as suas chances muito reduzidas.

O MDM apenas apresentou candidatos em Maputo-Cidade, Inhambane, Niassa e Sofala. 

Nestes quatro círculos, elegeram-se apenas 67 dos 250 deputados na Assembleia da República, tendo o MDM conseguido eleger 8 deputados. Contudo, nas eleições presidenciais, o candidato do MDM e seu fundador, o falecido Daviz Simango, foi permitido concorrer.

Vinte anos depois, a mesma estratégia volta a ser implementada. Venâncio Mondlane está aprovado (sem mácula) para a corrida eleitoral, mas a coligação que o suporta está rejeitada. 

Ironicamente, o candidato da Renamo, partido que se uniu à Frelimo e MDM para chumbar a CAD, Ossufo Momade, apareceu publicamente a lamentar a exclusão da coligação, alegando que é prejudicial à democracia.

A rejeição da CAD pode representar um recuo relativamente aos ganhos alcançados com a Constituição de 1990, que instaurou o sistema político multipartidário. 

Sobre a composição da CNE, várias deliberações do Conselho Constitucional têm alertado ao poder político para a necessidade da profissionalização dos órgãos de administração eleitoral, mas o apelo não tem tido eco devido à falta de vontade política, uma vez que o modelo actual permite o controlo do processo pelos partidos que compõem os órgãos.

O envolvimento do MDM na rejeição da CAD confirma a tese avançada pela TORRE.News, num artigo publicado a 25 de Junho, que sugeria que a CAD representa uma séria ameaça ao MDM. 

No artigo, cientistas políticos, sociedade civil e análises documentais convergiram na ideia de que uma eventual aprovação da candidatura da CAD e do seu candidato presidencial, Venâncio Mondlane, para os próximos pleitos eleitorais, não representava uma ameaça à Frelimo nem à Renamo, dada a consolidação das bases do seu eleitorado ao longo do tempo.  

Em contrapartida, o MDM, dada a sua condição actual, marcada por desafios internos, encontra-se numa zona de vulnerabilidade face ao perigo representado pela CAD.

Na altura, os analistas que falaram à TORRE.News avançavam a hipótese de que o MDM, nas eleições de 9 de Outubro, poderia ser relegado para uma posição desconfortável no xadrez político.