Dívidas Ocultas: tribunal continua a dissecar os subornos

O valor total dos subornos pagos pelo grupo baseado em Abu Dhabi Privinvest, no caso 'dívidas ocultas' de Moçambique ascende a pelo menos 55,6 milhões de dólares americanos, 1,37 milhões de euros e 602 mil milhões de meticais (cerca de dez milhões de dólares americanos), de acordo com os cálculos efectuados pelo Tribunal da Cidade de Maputo.

Dezembro 2, 2022 - 16:18
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Dívidas Ocultas: tribunal continua a dissecar os subornos
Dívidas Ocultas

Continuando a pronunciar-se sobre o caso, o juiz Efigenio Baptista disse que o maior suborno, no valor de 33 milhões de dólares, foi pago a Ndambi Guebuza, o filho mais velho do então Presidente da República, Amando Guebuza. O dinheiro destinava-se para facilitar o acesso da Privinvest ao Presidente, algo que parece ter sido bem sucedido.

Foi após o pagamento do suborno que foi assinado o contrato entre a Privinvest e a empresa Proindicus, a primeira de três empresas fraudulentas criadas através de um esquema para defraudar o Estado moçambicano.

O dinheiro para os subornos veio da Privinvest e, para o efeito, inflacionou grosseiramente o preço dos barcos de patrulha e outros activos que vendeu à Proindicus. O mesmo aconteceu com as outras duas empresas, Ematum (Empresa de Atum de Moçambique) e MAM (Mozambique Asset Management).


Entre os subornos significativos destacam-se 8,5 milhões de dólares cada um pagos aos associados da Ndambi Guebuza Teófilo Nhangumele e Bruno Langa; 3,2 milhões de dólares para António Carlos do Rosário, chefe da inteligência económica do serviço de segurança, SISE, e presidente das três empresas fraudulentas; 1,6 milhões de dólares para Renato Matusse, conselheiro político da Guebuza; e 750.000 euros para a secretária pessoal da Guebuza, Maria Inês Moiane.


Baptista salientou que este dinheiro não pertencia realmente à Privinvest, pois foi roubado através de contratos fraudulentos assinados com empresas estatais moçambicanas. O réu, afirmou, conspirou 'para defraudar o Estado moçambicano'.


Funcionários do Estado - tais como Rosário, o seu superior imediato, Gregório Leão, e outros operacionais do SISE - carregam uma culpa particular, pois sabiam que o que estavam a fazer era ilegal. Foi por isso que trataram de esconder a origem do dinheiro que receberam da Privinvest.

'Colocaram os seus próprios interesses acima dos do Estado moçambicano', declarou Baptista.


Ndambi Guebuza sempre negou ter recebido subornos da Privinvest, mas não conseguiu explicar as suas relações muito próximas com o vendedor sénior da Privinvest, Jean Boustani. Ndambi disse ao tribunal que tinha uma 'parceria' com Boustani, mas recusou-se a explicar a natureza desta parceria.


Se as suas relações com Boustani eram inocentes, perguntou o juiz, porque é que ele as escondia? Se esta parceria fosse legítima, não poderia haver 'nenhuma razão honesta' para este sigilo.

 

Qual foi a razão da viajem de Ndambi com Rosário, Nhangumele e Langa ao escritório da Privinvest na Alemanha e Abu Dhabi em 2011 e 2012? Porque ele entregou o seu passaporte a Boustani para abrir uma conta em seu nome no Commercial Bank of Abu Dhabi?


Essa conta, disse Baptista, esteve inactiva em 2015, mas recebeu 14 milhões de dólares em duas parcelas em 2013.


Além disso, existe uma grande quantidade de correspondência electrónica entre Ndambi, Nhangumele, Boustani e outros sobre o pagamento de subornos. Ndambi alegou que alguns dos e-mails eram forjados, assim como a sua assinatura em alguns documentos.


Por isso, o tribunal submeteu toda esta documentação a uma investigação forense - que não encontrou sinais de qualquer falsificação.

Baptista anotou que os subornos inflacionaram consideravelmente o preço do contrato Proindicus. Inicialmente, o contrato entre a Privinvest e a Proindicus era de 302 milhões de dólares. Acresce ao valor referido 50 milhões de dólares em subornos, mais 14 milhões de dólares supostamente para salários de pessoal sénior e para veículos, que elevou o preço para 366 milhões de dólares.


Os subornos, contudo, são uma parte relativamente pequena do dinheiro que Moçambique perdeu através das três empresas fraudulentas. Todas elas receberam enormes empréstimos dos bancos Credit Suisse e VTB da Rússia, e o governo de Guebuza garantiu ilicitamente esses empréstimos.

 

Baptista salientou que as garantias de empréstimo ultrapassaram os limites das garantias estabelecidas pelas leis orçamentais de 2013 e 2014. As garantias totais foram de 850 milhões de dólares para a Ematum, 622 milhões para a Proindicus e 540 milhões para a MAM (dos quais 278 milhões não foram utilizados).


O Banco de Moçambique, disse Baptista, não tinha poderes para aprovar tais empréstimos ilícitos - no entanto, fê-lo. Ele anotou que, para o efeito, Rosário intimidou o pessoal do banco central, insistindo que as garantias dos empréstimos eram uma questão urgente e de segurança nacional.


O juiz acrescentou que as garantias também violavam os acordos de Moçambique com o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional.