Trump e Musk na defesa dos Boers? A verdade por trás da narrativa contra a expropriação de terras na África do Sul

A recente decisão do Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de suspender a ajuda internacional à África do Sul reacendeu o debate global sobre a reforma agrária no país. Trump alegou que a expropriação de terras sem compensação representa um ataque directo aos agricultores brancos, conhecidos como boers, e prometeu sanções caso o governo sul-africano não revertesse essa política. bilionário Elon Musk, nascido na África do Sul, juntou-se à controvérsia, acusando o governo de "discriminação racial legalizada" e alimentando uma narrativa que retracta os brancos como vítimas de perseguição sistemática.

Fevereiro 4, 2025 - 13:33
Fevereiro 4, 2025 - 13:34
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Trump e Musk na defesa dos Boers? A verdade por trás da narrativa contra a expropriação de terras na África do Sul

O governo sul-africano, liderado pelo Presidente Cyril Ramaphosa, rejeitou categoricamente as acusações de Trump e Musk, afirmando que a expropriação de terras é uma medida essencial para corrigir desigualdades históricas resultantes do apartheid. Actualmente, cerca de 72% das terras agrícolas ainda pertencem à minoria branca, que representa apenas 8% da população, enquanto a maioria negra, que constitui aproximadamente 80% da população, controla apenas 4% das terras.


A lei de expropriação aprovada em 2023 permite que o Estado tome posse de terras abandonadas, não utilizadas ou adquiridas de forma ilegal durante o regime do apartheid. No entanto, não há evidências de expropriação em massa ou de ataques coordenados contra proprietários brancos. Especialistas argumentam que a campanha contra a reforma agrária visa desestabilizar economicamente a África do Sul e minar a credibilidade do governo.

A interferência de Trump nesta questão não é inédita. Em 2018, o ex-presidente já havia ordenado ao Departamento de Estado dos EUA que investigasse a situação da reforma agrária na África do Sul, ecoando teorias da conspiração propagadas por grupos supremacistas brancos. A retórica de Trump reforça um discurso de vitimização dos boers, amplamente difundido por plataformas de extrema-direita e organizações conservadoras nos Estados Unidos.


Elon Musk, por sua vez, alimentou ainda mais a controvérsia ao sugerir que o governo sul-africano estava a implementar "leis de propriedade abertamente racistas".  A posição de Musk, contudo, levanta suspeitas sobre possíveis motivações pessoais. Apesar de ter deixado a África do Sul nos anos 90, o bilionário mantém laços financeiros indirectos com o país, incluindo investimentos na mineração de lítio e outros minerais estratégicos. Teóricos da conspiração apontam que Musk pode estar a defender interesses ocultos ligados ao sector agrícola e à exploração de recursos naturais sul-africanos.


Analistas também destacam que a sua narrativa alinha-se com uma tentativa de reforçar a sua influência política nos EUA. Como aliado próximo de Donald Trump e figura de destaque no sector tecnológico, Musk tem utilizado a sua plataforma para fomentar debates que polarizam a opinião pública e consolidam a sua posição entre os conservadores americanos.

O governo sul-africano minimizou o impacto da suspensão da ajuda norte-americana, estimada em 440 milhões de dólares anuais, sublinhando que o país não depende dos EUA para manter a sua economia estável. Contudo, a medida pode afectar programas essenciais, especialmente na área da saúde, como o combate ao HIV/SIDA, que conta com financiamento significativo de instituições norte-americanas.


A tensão diplomática também levanta preocupações sobre a crescente influência de narrativas ocidentais que ignoram a realidade histórica da África do Sul. Especialistas alertam que a posição de Trump e Musk pode incentivar movimentos extremistas locais e dificultar o processo de reconciliação nacional.


A reforma agrária sul-africana continua a ser um dos desafios mais complexos do país. Enquanto Trump e Musk transformam a questão numa arma política para mobilizar as suas bases, a África do Sul mantém-se firme na sua posição de que a redistribuição da terra é essencial para corrigir injustiças históricas e garantir um futuro mais equitativo. Resta saber se a pressão internacional será suficiente para influenciar o rumo das políticas internas do país ou se Pretória resistirá às investidas externas e continuará a avançar com a sua agenda de transformação socioeconómica.