Xivotsongo: O “veneno” clandestino que ameaça a saúde pública e promove destruição massiva de jovens

A indústria clandestina de produção e venda de bebidas espirituosas de baixo custo, vulgarmente conhecidas por “Xivotsongo”, produzida frequentemente em métodos pouco ou nada laboratoriais e sem manuais de procedimento, estando completamente fora dos padrões aceitáveis pelas autoridades de saúde. Este “veneno” comercializado a preços reduzidos tem hipotecado o futuro da juventude, criando simultaneamente sérios problemas de saúde pública. Durante as manifestações violentas e actos de vandalismo em vários pontos do país, muitos jovens encontravam-se sob o efeito desta bebida, o que se acredita ter contribuído para intensificar o seu comportamento destrutivo.

Fevereiro 19, 2025 - 11:23
Fevereiro 19, 2025 - 11:43
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Xivotsongo: O “veneno” clandestino que ameaça a saúde pública e promove destruição massiva de jovens

Elaborados a partir de uma simples combinação de água, álcool e corante, os “Xivotsongos” transformaram-se num autêntico instrumento de destruição de jovens e idosos, em especial de aqueles com rendimentos baixos. De fácil acesso, podem ser adquiridos em praticamente qualquer esquina, tanto em grandes cidades como em bairros periféricos e zonas rurais. Para muitos, marginalizados e sem oportunidades de subsistência, estas bebidas funcionam como um refúgio de fuga aos problemas diários.

A produção clandestina é controlada, na sua maioria, por cidadãos indianos, chineses e portugueses, operando em fábricas ilegais localizadas em áreas como a Matola, Machava e arredores da cidade de Maputo. Embora as autoridades,        incluindo a Inspecção Nacional das Actividades Económicas (INAE), tenham conhecimento da actividade, a corrupção e as ligações poderosas em torno deste negócio permitem que a operação prossiga impune. As garrafas apresentam endereços e contactos que, na prática, são fictícios.

Um trabalho de investigação realizado pela TORRE.News indica que, para além do consumo em terminais de transporte, em escolas e noutros pontos de grande concentração, estas garrafinhas chegam a estar presentes em unidades de saúde. Uma fonte anónima ligada à Ordem dos Médicos referiu que, no Hospital Central de Maputo (HCM), alguns pacientes internados em enfermarias de ortopedia solicitam aos familiares que levem estas bebidas durante as visitas, alegando que o seu consumo lhes permite dormir, retardando simultaneamente a sua recuperação e encarecendo o tratamento.

A Directora-Geral da INAE, Ana Rita Freitas, reconhece que a instituição está de mãos atadas, justificando que a lei não estabelece regulações específicas sobre a produção e composição de bebidas alcoólicas em Moçambique. Apesar de ter solicitado análises ao sector da saúde para aferir os teores alcoólicos e a toxicidade dos “Xivotsongos”, até ao momento não obteve resposta. Freitas lamenta que estas misturas, vendidas a preços tão baixos quanto 35 meticais, continuem a “queimar” a saúde dos consumidores, reiterando a necessidade urgente de criar normas para combater este fenómeno.

De acordo com o Director-Executivo da Associação dos Produtores e Importadores de Bebidas Alcoólicas (APIBA), as empresas que produzem “Xivotsongos” não cumprem as obrigações fiscais nem exibem o selo oficial instituído pelo Governo para regular o mercado das bebidas alcoólicas. A APIBA denuncia ainda que os próprios endereços das fábricas são desconhecidos ou inexistentes, impossibilitando o controlo por parte de entidades reguladoras, e sugere que há protecção de figuras influentes que asseguram a continuidade deste mercado clandestino.

As consequências trágicas deste consumo desenfreado reflectem-se em histórias como a de Chiquito, de 23 anos, que morreu após se tornar dependente dos “Xivotsongos”. A sua irmã, Celina Inguane, relata que o jovem começou por “brincadeira” com amigos, adquirindo um vício que, ao agravar-se, o conduziu a uma doença fatal no fígado. Para muitas famílias, o desaparecimento precoce de jovens que poderiam contribuir para o desenvolvimento do país constitui um pesado fardo emocional e económico, perpetuando o ciclo de pobreza.

Enquanto não se adoptam medidas concretas e eficazes para colocar fim à produção e à comercialização deste tipo de bebidas, quer através de legislação específica quer de fiscalização rigorosa, o “Xivotsongo” continuará a propagar-se por todo o território nacional. As autoridades são constantemente acusadas de negligência, permitindo que milhares de pessoas, sobretudo jovens sem outras perspectivas de vida, mergulhem num consumo que destrói a saúde e alimenta um mercado clandestino cada vez mais lucrativo e poderoso.