A estratégia diplomática que enfraqueceu Renamo
O Presidente da República, Filipe Nyusi, revelou uma astúcia notável ao conseguir, através de meios diplomáticos, desarmar a última base da Renamo em Vanduzi, distrito de Gorongosa, na província de Sofala, a 15 de Junho do ano passado.
Este desfecho foi alcançado no âmbito do Acordo de Maputo sobre o Desarmamento, Desmobilização e Reintegração (DDR) das forças residuais da Renamo, e marca um ponto decisivo no enfraquecimento da capacidade de pressão da Renamo sobre o Governo da Frelimo.
Este marco histórico coincidiu com um período de alegada fraude eleitoral, sem precedentes, durante o qual a Renamo reivindicou a vitória em vários municípios, incluindo Maputo e Matola. No entanto, os resultados foram posteriormente alterados, privando a Renamo de uma vitória que poderia ter consolidado sua posição política.
Venâncio Mondlane, candidato da Renamo em Maputo, liderou marchas em protesto, exigindo a entrega da capital aos legítimos vencedores. Contudo, essas manifestações não prosperaram, em grande parte devido à falta de apoio de Ossufo Momade, o líder da Renamo na altura, cuja lealdade a Nyusi e à Frelimo tem sido amplamente questionada.
Filipe Nyusi reivindicou, no seu último informe ao parlamento, na semana passada, o mérito por ter alcançado a paz e a reconciliação nacional, destacando os "caminhos ousados" que percorreu, mesmo colocando a sua vida em risco.
Em particular, recordou a sua visita à serra da Gorongosa, em 18 de Agosto de 2017, onde se encontrou com o então líder da Renamo, Afonso Dhlakama, para negociar a paz, num esforço que culminou no desmantelamento das forças residuais da Renamo.
Este enquadramento de uma Renamo enfraquecida é partilhado por analistas do Centro de Integridade Pública (CIP), nomeadamente Lázaro Mabunda e Edson Cortez.
Mabunda, ao falar à TORRE.News, argumenta que o legado de Nyusi deve ser entendido como uma estratégia para asfixiar a oposição e consolidar um regime cada vez mais autoritário em Moçambique.
Ele aponta que a perda de influência da Renamo também se deve à incapacidade do partido em escolher um sucessor à altura do carismático Afonso Dhlakama.
"O legado negativo de Filipe Nyusi reside na consolidação de um regime autoritário, caracterizado por uma forte presença policial e militar nas ruas, a eliminação do espaço cívico, e a repressão de manifestações," afirmou Mabunda, sublinhando a transformação do país num ambiente onde a contestação pública é sistematicamente suprimida.
Num debate organizado pelo consórcio Mais Integridade, Edson Cortez reforçou esta visão, argumentando que a Renamo já não representa uma solução viável para governar Moçambique, insinuando uma aliança tácita entre a Renamo e a Frelimo que apenas serve para consolidar a posição da Renamo como a segunda força política no país.
"A Renamo agora é um partido inapto, incapaz e não representa alternativa para os moçambicanos," disse Cortez.
Historicamente, a visita de Nyusi às matas da Gorongosa em 2017 foi um claro sinal do seu compromisso em pôr fim à guerra. Contudo, este processo sofreu um revés significativo com a morte de Afonso Dhlakama a 3 de Maio de 2018, o que gerou incerteza sobre a continuidade das negociações de paz.
Na altura, Nyusi expressou o seu receio de que o desaparecimento de Dhlakama pudesse ser explorado politicamente, alertando para que o legado do líder da Renamo fosse respeitado.
"Foi um importante interlocutor no processo de construção da democracia e da estabilidade no país. Não se faça aproveitamento político," disse Nyusi na sua primeira reação à morte de Dhlakama.
No entanto, a eleição de Ossufo Momade como presidente da Renamo em Janeiro de 2019, numa disputa interna que envolveu figuras de destaque como Manuel Bissopo, Elias Dhlakama e Hermínio Morais, foi capitalizada por Nyusi para avançar com o seu plano de paz e, simultaneamente, enfraquecer a Renamo.
Em Agosto de 2019, Nyusi e Momade assinaram o acordo de cessação de hostilidades entre as forças governamentais e o braço armado da Renamo, seguido pela assinatura do Acordo de Maputo, que formalizou o compromisso de ambas as partes com o DDR.
Desde então, a Renamo perdeu progressivamente a sua capacidade de influenciar a política moçambicana, consolidando o legado de Nyusi como o líder que, através de uma estratégia diplomática astuta, conseguiu desarmar e enfraquecer a principal força de oposição no país.