Advogados exigem suspensão da entrada em vigor do código comercial

A Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM) exige a suspensão do novo Código Comercial, instrumento previsto para entrar em vigor em Setembro do ano em curso, aprovado em finais de Março último, pelo governo, ao abrigo de uma autorização legislativa aprovada pela Assembleia da República (AR), o parlamento do país.

Julho 23, 2022 - 19:00
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Falando recentemente, em conferência de imprensa convocada pela OAM para pronunciar-se sobre o projecto do novo Código Comercial e suas implicações no mundo dos negócios no país, o bastonário da Ordem, Duarte Casimiro, aponta determinados artigos do documento como sendo incongruentes entre si, e o pior ao serem utilizados com os diplomas e outra legislação que tem a ver com o direito comercial.

Afirmou que o sistema jurídico do país reage de uma forma forte à violações legais chocantes para a sociedade e o mesmo sistema determina a sua nulidade.


“Como podemos entender que as deliberações das assembleias-gerais das sociedades, sancionadas legalmente com nulidade, possam ser renovadas, como prevê o artigo 133 do novo Código Comercial, portanto, parece um absurdo”, disse Casimiro.

“Nas acções de impugnações e deliberações sociais”, continuou, “dispensa-se a junção da acta […]. Sucede, porém, que no artigo 134, deste mesmo Código, diz que a deliberação social só se prova com acta. Isso já é uma contradição evidente”.


Casimiro questionou qual será a acção do juiz perante uma situação destas, tendo de seguida sublinhado que o Código do Processo Civil também exige a junção da acta para validar litígios nas sociedades.


O Código Civil exige que quando a lei exige a apresentação de um documento como prova, a prova documental não pode ser substituída pela prova testemunhal.


“Então, se [o Código Comercial] diz que é para eliminar a acta, que prova é que vamos usar para este efeito?”, questionou.


Apontou ainda casos em que, o menor de 16 anos de idade pode fazer parte dos órgãos comerciais das sociedades, segundo o Código Comercial, através do seu representante legal, todavia, o mesmo Código Comercial determina que o administrador de uma sociedade deve ser uma pessoa singular com capacidade jurídica plena.


“É caso para questionar, como é que pode um menor que não tem capacidade de exercício de direito pleno, fazer parte da administração de uma sociedade; e como poderá o seu representante legal, que não foi eleito pela assembleia-geral, exercer a administração da sociedade”, disse, acrescentando de seguida que se trata de contradições que do ponto de vista da OAM devem ser verificadas senão “vai ser muito difícil fazer a aplicação deste novo Código Comercial”.


Casimiro indagou ainda com que fica a responsabilidade dos administradores perante os órgãos sociais e aos credores da sociedade, incluindo os trabalhadores da própria empresa, em conformidade com o novo Código Comercial, tendo em conta que o referido administrador é menor e o seu representante legal não é administrador.

As alegadas incongruências, que o bastonário considera como graves, entram em choque com preceitos legais vigentes.


Alguns erros, segundo o bastonário, revelam algum desconhecimento do sistema jurídico moçambicano, no seu todo, de onde deriva a falta de adequação, conciliação e ajustamento ao ordenamento jurídico.


Segundo ele, as incongruências prejudicam a apresentação sistemática, coerente e sólida do sistema jurídico do país.


“Os erros graves que, por exemplo, constam do Código Comercial, também se verificam noutros instrumentos que eu me referi há bocado. Eles são elaborados e publicados sem que efectivamente haja este espaço de troca de ideias”, disse Casimiro.

Sublinhou que, aparentemente, a OAM nota uma “pressa” do governo em publicar documentos, e não percebe a razão da “alegada pressa”.


Casimiro disse ainda existirem no novo Código Comercial erros graves de terminologia, inaceitáveis, em face das suas “potenciais consequências”.


Exemplificou o artigo 128, do Código Comercial, a propósito das cláusulas que versam sobre deliberações sociais. Este remete ao leitor ao artigo 116, do mesmo Código, “mas o artigo 116 nada tem a ver com esta matéria”.


Com os erros detectados no novo Código Comercial, segundo Casimiro, torna-se quase impossível uma aplicação correcta da lei.


Falando em Março passado, o porta-voz do governo, Filimão Suaze, disse que o Código [Comercial] tinha tendência “modernista e que vêm conformar a nossa legislação comercial com aquilo que é [...] a forma como o comércio internacional é desenvolvido neste momento”.